Saúde

A dispensa de licitação criada para enfrentamento da pandemia de COVID-19

No dia 11 de março de 2020 a Organização Mundial de Saúde (OMS) declarou pandemia pelo surto do coronavírus SARS-CoV-2, que gerou uma crise sanitária global por mais de 2 anos e causou instabilidade em setores como a saúde, economia, educação, cultura, política em todos os países do globo. O Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, reconheceu o estado de calamidade pública no Brasil, em decorrência da pandemia de COVID-19 declarada pela OMS e, com objetivo de combater e retardar a transmissão do novo vírus, bem como abrandar os danos causados à saúde da população, adotou certas providências, destacando-se, dentre elas, a Lei 13.979, de 06 de fevereiro de 2020 que “dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2019”. À época, a Advocacia Geral da União (2020c, p. 3) pontuou que a situação singular que assolava o país e o mundo recomendava um tratamento diferenciado para as contratações públicas, no sentido de minimizar a ocorrência de potenciais prejuízos, em uma ponderação necessária entre, de um lado, o direito à vida e à saúde individual e coletiva e, de outro, o princípio da economicidade administrativa. E por tal razão, a mencionada Lei 13.979 estabeleceu um conjunto de regras diferenciadas para as contratações voltadas ao enfrentamento da situação de emergência em saúde pública provocada pela COVID-19, qual seja uma nova hipótese de dispensa de licitação Certo é que, como regra estabelecida no art. 37, XXI, da Constituição Federal, as contratações realizadas pela Administração Pública devem ser precedidas de processo de licitação, requisito essencial, de ordem constitucional, ressalvados os casos especificados na legislação. Assim, pode-se verificar que a Carta Constitucional viabiliza a possibilidade de contratação direta, deixando em aberto a fixação por lei posterior, in verbis: Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (…) XXI – ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações. (BRASIL, 1988). Nessa acepção, para Jorge Ulisses Jacoby Fernandes (2000, p. 670/671): A licitação é princípio constitucional, vetor da ação da administração pública que garante aos administrados licitantes a possibilidade de, em condições e tratamentos isonômicos, disputarem entre si a participação nas obras, serviços, compras, alienações, concessões, locações e demais negócios que os órgãos e entidades da Administração Pública pretendem efetuar. Assim, em alguns casos previamente estabelecidos pelo legislador o princípio da licitação cede espaço, por exemplo, ao princípio da economicidade ou ao primado da segurança nacional, ou ainda para garantir o interesse público maior, concernente à necessidade de o Estado intervir na economia ou manter atividade ou serviço essencial. Por outras palavras, Pietro (2018, p. 485) enfatiza que a exceção à regra geral de licitação aplica-se em razões de áleas excepcionais. Isto é, a dispensa é cabível em certas situações em que o retardamento do procedimento é incompatível com a urgência na celebração do ajuste ou quando sua formalização puder, em vez de favorecer, vir a contrariar o interesse público. Considerando o contexto da época e a vigência da antiga legislação de contratações, a Lei 8.666/1993 trazia a regulamentação do dito art. 37, inciso XXI da Constituição Federal, estabelecendo normas gerais sobre licitações e contratos administrativos, bem como indicando casos de contratação direta como exceções à obrigatoriedade de licitar. Nesse ponto a Antiga Lei de Licitações, em seu art. 24, dentre diversas hipóteses e especificamente no inciso IV, apresentava dispensa de licitação para casos de emergência ou calamidade pública que ocasionem prejuízo ou comprometam a segurança de pessoas, obras, equipamentos e bens públicos, conforme segue: Art. 24. É dispensável a licitação: (…) IV – nos casos de emergência ou de calamidade pública, quando caracterizada urgência de atendimento de situação que possa ocasionar prejuízo ou comprometer a segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares, e somente para os bens necessários ao atendimento da situação emergencial ou calamitosa e para as parcelas de obras e serviços que possam ser concluídas no prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias consecutivos e ininterruptos, contados da ocorrência da emergência ou calamidade, vedada a prorrogação dos respectivos contratos;” (BRASIL, 1993). Da leitura deste dispositivo legal, em primeira análise, pôde-se imaginar que se amoldava à situação enfrentada na pandemia de coronavírus. Todavia, uma nova hipótese de dispensa de licitação foi regulada pela Lei 13.979/2020, justamente, com objetivo de estender a situação de emergência prevista no aludido art. 24, IV, de forma “independente à regra geral de licitações, contemplando um conjunto de ferramentas, temporárias e singulares, disponíveis ao agente público para enfrentar a situação de extrema anormalidade que o país vivencia” (ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO, 2020d, p. 11). Certificava tal entendimento, da especialidade da nova modalidade de dispensa de licitação, suas regras singulares e seu caráter temporário, o Parecer nº 002/2020/CNMLC/CGU/AGU de Modelos Covid-19, emitido pela Advocacia Geral da União (BRASIL, 2020c, p. 3-4), da seguinte forma: Considerando a situação de extrema urgência e emergência, a lei procurou abarcar uma hipótese de contratação direta específica e temporária, em que pese guardar inspiração em algumas das disposições regulares das contratações emergenciais disciplinadas pela Lei n. 8.666/93. Note-se que as contratações diretas a serem entabuladas no âmbito da Lei n. 13.979/2020 não se confundem em absoluto com as contratações emergenciais típicas, seja pelo procedimento diferenciado tratado pela norma, seja pela aplicação direcionada e temporária. Dessa forma, ainda que haja eventualmente similaridades, as hipóteses de dispensa são material e faticamente distintas, devendo ser tratadas de forma independente. Não há que se falar em arrastamento dos entendimentos doutrinários e jurisprudenciais relativos

A dispensa de licitação criada para enfrentamento da pandemia de COVID-19 Read More »

Direito à saúde: a responsabilidade solidária entre os entes federados

A garantia à saúde é um direito fundamental previsto na Constituição Federal do Brasil, sendo que há a responsabilidade solidária entre os entes federativos. União, estados e municípios são concomitantemente responsáveis por assegurar o acesso à saúde de todos os cidadãos. Assim, esta tarefa que não se restringe a uma única esfera de governo. A responsabilidade solidária é caracterizada pela obrigação compartilhada entre as partes envolvidas, neste caso, os entes federativos. Nesse sentido, significa dizer que todos têm o dever de garantir que a saúde seja acessível e de qualidade, independentemente da origem da demanda. A omissão de um dos entes não exime os demais da obrigação de assegurar este direito fundamental. Isto está ligado ao objetivo de desburocratizar e agilizar o acesso à saúde. Com a responsabilidade solidária, se um ente federativo não conseguir atender à demanda, os demais têm o dever de intervir e assegurar o acesso aos serviços de saúde necessários, eliminando assim, em teoria, quaisquer obstáculos jurídicos ou administrativos que possam prejudicar o cidadão. No entanto, na prática, a implementação deste direito pode se mostrar complexa. Muitas vezes, surge a necessidade de arbitrar conflitos e estabelecer a prioridade de ações entre os entes federativos. Isso porque a capacidade de cada um desses entes de prover serviços de saúde varia amplamente, dependendo de diversos fatores, como orçamento, infraestrutura disponível e recursos humanos. No contexto brasileiro, a responsabilidade solidária na saúde tem sido tema de intensos debates, tanto na academia quanto nos tribunais. Há uma busca contínua por equilíbrio entre a autonomia dos entes federativos e a necessidade de uma atuação conjunta e solidária. O objetivo final é sempre assegurar a todos os cidadãos um direito básico e fundamental: o acesso à saúde de qualidade. Tem-se que o artigo 23, inciso II, da Constituição contempla como competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios a tarefa de “cuidar da saúde” das pessoas naturais, ao passo que seu artigo 30, inciso VII, atribui aos Municípios a competência para “prestar, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde da população”. Embora o Município figure como o prestador direto dos serviços, deve contar com a cooperação técnica e financeira do Estado e da União para a consecução das ações e serviços de saúde de forma universal, igualitária e integral. A Corte Suprema, por ocasião do julgamento dos Embargos Declaratórios opostos no RE nº 855.178 com repercussão geral (tema 793), manteve a tese da responsabilidade solidária, e a delineou da seguinte forma: “Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro.” Ou seja, a decisão em momento algum mitigou a solidariedade nas ações de saúde. Na verdade, decidiu que ambos os entes políticos têm obrigação perante o sujeito, mas que o ente que custear o serviço de saúde sem ser o responsável segundo as regras administrativas de distribuição da área de saúde deve ter garantido o direito de regresso. Perante o paciente usuário do SUS nada muda e a discussão sobre a responsabilidade administrativa deve ser discutida em âmbito autônomo e não na ação de saúde. Ainda, é válido mencionar o Tema 793 de repercussão geral do STF, que tem a seguinte redação: “O tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, porquanto responsabilidade solidária dos entes federados. O polo passivo pode ser composto por qualquer um deles, isoladamente ou conjuntamente” Desta forma, infere-se que as obrigações de saúde do SUS são solidárias, devendo tanto o Município, quanto os Estados e a União fornecer a saúde de qualidade para o indivíduo. Conheça o Canal da Incap no Youtube <a href=”www.incapgp.com.br”>Página Inicial</a>

Direito à saúde: a responsabilidade solidária entre os entes federados Read More »

COMO REALIZAR A QUALIFICAÇÃO TÉCNICA PARA AQUISIÇÃO DE MEDICAMENTOS

O artigo 30 da Lei n. 8.666/93, o qual se equipara ao art. 67 da Lei n. 14.133/21, limita os documentos que a Administração pode exigir na qualificação técnica do certame, podendo ser: Os documentos permitidos acabam sendo mais direcionados a prestação de serviços. Mas, então, como fazer para garantir uma aquisição de qualidade para a Administração? Essa é fácil: utilizando das legislações específicas existentes para cada objeto. O problema nós sabemos: identificar quais são as legislações aplicadas a cada objeto, visto que o volume de contratações de uma Administração Municipal é grande e – principalmente nos municípios pequenos – não existe pessoal capacitado para todos os tipos de objeto. Dessa forma, vamos te ajudar na elaboração da qualificação técnica de processos para aquisição de medicamentos. O primeiro item vai depender da legislação de cada estado, contudo, acredito que praticamente todas as unidades federativas são uníssonas ao exigir o Alvará Sanitário. Nesse sentido, no Estado de Mato Grosso do Sul você encontrará a previsão no Código Sanitário Estadual (MS) – Lei n. 1.293, de 21 de setembro de 1992, que determina: Art. 220. Fica sujeito às normas instituídas nesta seção e demais artigos deste Título, o licenciamento pelo órgão sanitário competente, das seguintes atividades: extração, produção, fabricação, purificação, fracionamento, embalagem, reembalagem, importação, exportação, armazenamento, expedição de drogas, medicamentos, insumos farmacêuticos, correlatos de medicamentos, produtos de higiene, cosméticos, perfumes, saneantes domissanitários, águas minerais ou naturais de fonte, bebidas e outros definidos, conforme a legislação federal vigente. Ou seja, todas as empresas que desejam comercializar ou fabricar medicamentos para as Administrações Públicas do MS, devem ter licenciamento sanitário, logo, para que forneça o produto para a Administração, precisa cumprir com o dispositivo legal. Outro ponto bem importante, é que há uma determinação na Lei Federal n. 6.360, de 23 de setembro de 1976[1], de que todos os medicamentos devem ser registrados no Ministério da Saúde. Assim, a Administração deve verificar, na fase da habilitação, se a empresa licitante irá entregar produtos condizentes com a mencionada exigência legal. Por conseguinte, o Gestor deve observar a Resolução da Diretoria Colegiada-RDC n. 16, de 1° de abril de 2014, que versa sobre as autorizações de funcionamento. Aqui, há uma leve separação em relação aos medicamentos controlados e aos medicamentos básicos. Quando desejar a aquisição de medicamentos básicos, não controlados, cabe a Administração solicitar a AFE (Autorização de Funcionamento) expedida pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) com base no seguinte dispositivo: Art. 3. A AFE é exigida de cada empresa que realiza as atividades de armazenamento, distribuição, embalagem, expedição, exportação, extração, fabricação, fracionamento, importação, produção, purificação, reembalagem, síntese, transformação e transporte de medicamentos e insumos farmacêuticos destinados a uso humano, cosméticos, produtos de higiene pessoal, perfumes saneantes e envase ou enchimento de gases medicinais. No entanto, diante da existência de medicamentos controlados no certame, recomendamos a inclusão de necessidade de Autorização de Funcionamento de Empresa Especial (AE), de titularidade da empresa participante da licitação, expedida pela ANVISA, no caso de cotação de medicamentos sujeitos a controle especial, conforme orienta a RDC-16: Art. 4. A AE é exigida para as atividades descritas no art. 3 ou qualquer outra, para qualquer fim, com substâncias sujeitas a controle especial ou com os medicamentos que as contenham, segundo o disposto na Portaria SVS/MS no 344, de 1998 e na Portaria SVS/MS no 6, de 29 de janeiro de 1999. Não obstante, tratando-se de medicamento controlado, também recomendamos a inclusão da exigência de Certificado de responsabilidade técnica do farmacêutico, emitido pelo Conselho Regional de Farmácia, com fundamento nos seguintes dispositivos: Decreto n. 85.878, de 7 de abril de 1981. Art 1. São atribuições privativas dos profissionais farmacêuticos: I – desempenho de funções de dispensação ou manipulação de fórmulas magistrais e farmacopéicas, quando a serviço do público em geral ou mesmo de natureza privada; II – assessoramento e responsabilidade técnica em: a) estabelecimentos industriais farmacêuticos em que se fabriquem produtos que tenham indicações e/ou ações terapêuticas, anestésicos ou auxiliares de diagnóstico, ou capazes de criar dependência física ou psíquica; b) órgãos, laboratórios, setores ou estabelecimentos farmacêuticos em que se executem controle e/ou inspeção de qualidade, análise prévia, análise de controle e análise fiscal de produtos que tenham destinação terapêutica, anestésica ou auxiliar de diagnósticos ou capazes de determinar dependência física ou psíquica; c) órgãos, laboratórios, setores ou estabelecimentos farmacêuticos em que se pratiquem extração, purificação, controle de qualidade, inspeção de qualidade, análise prévia, análise de controle e análise fiscal de insumos farmacêuticos de origem vegetal, animal e mineral; d) depósitos de produtos farmacêuticos de qualquer natureza; Lei n. 3.820, de 11 de novembro de 1960 Art. 24. – As empresas e estabelecimentos que exploram serviços para os quais são necessárias atividades de profissional farmacêutico deverão provar perante os Conselhos Federal e Regionais que essas atividades são exercidas por profissional habilitado e registrado. Como pode ser observado, os documentos aqui mencionados estão previstos em legislação especial, ou seja, se encaixam na hipótese ofertada pelo art. 30, IV da Lei Federal n. 8666/93, assim como no art. 67, IV da Nova Lei de Licitações, Lei Federal n. 14.133/21, logo, caso não sejam exigidos em edital, poderão ser objeto de impugnação ao Edital. Assim, recomendamos que você fique atento a atualização das legislações ora mencionadas! [1] Lei no 6.360, de 23 de setembro de 1976. Art. 12 – Nenhum dos produtos de que trata esta Lei, inclusive os importados, poderá ser industrializado, exposto à venda ou entregue ao consumo antes de registrado no Ministério da Saúde. Conheça o Canal da Incap no Youtube <a href=”www.incapgp.com.br”>Página Inicial</a>

COMO REALIZAR A QUALIFICAÇÃO TÉCNICA PARA AQUISIÇÃO DE MEDICAMENTOS Read More »